Última festa da casa noturna que foi referência da e-music no Brasil, tendo sido eleita a 18º melhor do mundo em 2017, e por onde passaram 5 milhões de pessoas.
Quando a música parou de tocar na pista externa, o sol já ardia nas milhares de pessoas que tinham passado as 11 últimas horas dançando. Já eram 10h de domingo (8), mas ninguém parecia querer se despedir da casa que, por 20 anos, foi referência em música eletrônica no Brasil. A última balada do Anzu Club, em Itu (SP), foi marcada por lotação máxima, gente do lado de fora, choro e saudosismo.
Inaugurado em 1997, em Itu, a 90 quilômetros de São Paulo, o clube recebeu grandes nomes do eletrônico internacional e somou um público aproximado de 5 milhões de pessoas em mais de 2.500 festas nas duas décadas de funcionamento.
Apesar da idade “avançada”, a casa ainda estava em plena forma, tendo sido eleita a 18ª melhor balada do mundo neste ano pela revista inglesa especializada em música eletrônica DJ MAG.
Na noite de encerramento oficial, foi necessário fechar as portas para evitar superlotação.
Opção ao pagode e axé
O Anzu (chamado erroneamente no feminino por muitos frequentadores) iniciou suas atividades em 2 de outubro de 1997, com a ideia de ser referência na cena eletrônica brasileira e uma opção na época em que a maioria das casas eram focadas em pagode e axé, ritmos que mais faziam sucesso.
Com um restaurante acoplado à pista de dança, o clube abria quatro vezes na semana: quinta, sexta, sábado e domingo. Com o tempo, o espaço gourmet deu lugar a outro ambiente e às atividades voltadas apenas para a música eletrônica.
O sucesso no Brasil levou o Anzu a representar o país durante quatro anos em Ibiza, berço da música eletrônica do mundo, em um dos festivais mais importantes do segmento. O proprietário Miltinho Muraro, de 44 anos, lembra que foi necessário fretar um avião para levar toda a estrutura de equipamentos e pessoas para a Espanha. “Foi um momento muito marcante. Ibiza é o ícone da música eletrônica no mundo e levamos o nome do Brasil para lá”, relembra.
Emoção na última noite
Com público estimado de 4 mil pessoas na última noite – com muita gente do lado de fora – houve quem não conseguiu conter a emoção. “Achava que era jogada de marketing, que não ia fechar de fato. Estou ensaiando um abraço às paredes, até um choro. Vai ser difícil desapegar”, diz a estudante Helen Camila Oliveira, que nasceu no mesmo ano em que a balada foi criada.
“É muito triste, estou vindo para chorar. É minha segunda casa, vou ficar sem casa todo fim de semana. Nossa geração está de luto. Como eu tenho 20 anos, está novinha, acho que deveria continuar”, lamenta a estudante Isabela Ribeiro Torres. A última noite oficial começou no sábado (7), às 23h, e só acabou no outro dia, quando o sol já tomava conta da área externa, conhecida como “pistinha”, uma espécie de pós-balada que só terminava quando a última pessoa deixasse o local.
Opção de mercado
A decisão de encerrar as atividades foi, segundo Muraro, uma simples “opção de mercado”. Ele diz que as raves, os grandes festivais e festas informais, com um custo de operação menor, inflacionaram o mercado e diminuíram o público nas baladas do segmento.
“Hoje temos uma moeda muito desvalorizada para ofertar grandes cachês. Além disso, o mercado abriu muito. Há 10 anos a Europa era o grande player. Hoje, Ásia e Estados Unidos são os maiores consumidores desses artistas, o que elevou bastante as ofertas. Temos um cenário totalmente corrompido, as práticas da chamadas “agências” de Djs, que deixaram de ser prestadores de serviços para serem os principais concorrentes dos clubes”, explica o empresário.
A ressaca de quem esteve na última noite do Anzu, pelo jeito, será eterna.
Edição: Aurélio Fidêncio
Matéria/ Foto: Emilio Botta
Fonte: Jornalismo Globo